É possível definir a palavra cultura como sendo um conjunto de padrões de comportamento, crenças, conhecimentos e costumes que distringuem um grupo social. É possível também aplicar a ela o significado de complexo de atividades, instituições e padrões sociais ligados à criação e difusão de, digamos, uma atividade esportiva. A junção de tantos sentidos permite afirmar que o futebol tem a sua cultura e, mais que isso, que o torcedor de futebol tem a sua cultura.
Reside aí o grande problema do futebol brasileiro desses nossos dias tão restritivos: uma meia dúzia de filhos-da-puta-de-gravata (deixemos o puritanismo e os eufemismos de lado ao menos por um instante) decidiu se apoderar da cultura do futebol, imaginando que ela poderia ser moldada aos seus interesses financeiros.
Mas, afinal, quem são os filhos da puta?
Ah, eles são muitos. Dirigentes de clube, presidentes de federação, políticos, empresários, agentes de jogadores, jornalistas, procuradores, promotores, juristas, advogados em geral, apresentadores de TV, comentaristas, proprietários de veículos de comunicação, donos de empresa, marqueteiros idiotas, burocratas os mais diversos etc.. Os senhores devem ter notado que nem todos usam gravata. Mas todos, sem exceção, são filhos da puta.
Eu bem iniciei o ano tentando maneirar no tom crítico deste blog, de modo a torná-lo menos ácido, mas os filhos da puta têm se esforçado (ainda que por interesses escusos) bem mais do que eu. Logo, não dá pra deixar de ser ranzinza.
Chegamos então, depois de tanta tergiversação, à motivação deste post: os seguidos ataques contra a cultura do futebol. Que fique claro que eles são muitos e a cada dia mais duros, mas uns incomodam mais do que outros, e despertam em qualquer torcedor de futebol (excluo aqui os simpatizantes) uma ira que beira o incontrolável.
Começo pelo mais detestável de todos os atentados praticados contra a cultura do futebol: a sua equivalência a práticas de entretenimento. É aquele papo furado segundo o qual “futebol é espetáculo”. Há muitas maneiras de dizer isso, todas elas tentando equiparar o esporte a uma peça de teatro ou a qualquer tipo de evento sócio-cultural. Desistam, filhos da puta: o torcedor (aquele que vai ao estádio) nunca vai encarar o futebol como um espetáculo ou como uma forma de entretenimento. O futebol é qualquer coisa, menos isso.
Os que tentam fazer essa comparação são logo aqueles que buscam conferir ao torcedor a condição de consumidor. São aqueles que tentam fazer crer que “futebol é business” (o que interessa é o dinheiro). Estão cometendo um atentado dos mais graves contra a cultura do esporte e do torcedor. São assassinos do futebol.
Da ação direta desses filhos da puta decorre uma série de variantes malignas, como a proliferação do pay-per-view, a ostentação do conceito de torcedor-de-sofá, a entrada avassaladora de certas empresas predatórias no futebol, a campanha de demonização das torcidas organizadas e, a pior parte, a repressão desmedida nos estádios de futebol, com ápice em São Paulo, onde hoje se proíbe de tudo, de bandeiras a pedaços de papel.
Dia após dia, o torcedor neste país é obrigado a conviver com notícias que atentam contra a cultura do futebol. O mundo está mesmo virando um lugar chato, com patrulha por todos os cantos, mas isso é um pouco mais forte no mundo do futebol, que parece canalizar toda sorte de crápulas filhos da puta interessados em lucrar com os seguidos atentados culturais.
Vejamos, por exemplo, o que aconteceu agora no Rio de Janeiro, com a proibição da venda de ingressos em dias de jogos.
É um completo absurdo, que acaba por passar despercebido por certos meios de comunicação exatamente porque a preocupação destes não é com o sujeito que vai ao estádio, mas sim com o camarada que fica com a bunda no sofá de casa.
Pois bem, o que aconteceu no Rio explica-se assim:
Alguma besta humana decidiu um dia que a venda de ingressos em dias de jogo podia causar brigas. Não há qualquer comprovação empírica de tal fato, mas a besta humana (lembro que a tese foi muito defendida por Wanderley Nogueira, da hoje nociva Rádio Jovem Pan) levou essa ideia adiante e ganhou a simpatia de crápulas como, sei lá, o nosso amigo Marco Polo Del Nero.
Daí que os ingressos deixaram de ser vendidos em SP antes dos clássicos, em um claro prejuízo contra o torcedor. Pior: em claro desacordo com a cultura do futebol e do torcedor brasileiro, acostumado que está a comprar os ingressos no dia do jogo, horas antes. Não se muda uma cultura do dia para a noite, mas isso não foi levado em conta por alguns de nossos dirigentes.
Aconteceu isso no Rio: deixaram de vender ingressos nas horas anteriores a um jogo concorrido do Flamengo, a torcida se aglomerou, a BWA (olha ela aí!) resolveu reabrir as bilheterias e aí tivemos confusões na porta do Maracanã.
Vejam, pois: a confusão não se deu por culpa dos torcedores (e nem da BWA, ressalte-se), mas sim porque dirigentes cretinos decidiram fechar as bilheterias logo no momento de maior afluxo de público. Deu no que deu, e agora fica fácil culpar a torcida. Em tempos de restrição absoluta, apela-se para a medida mais radical: proibição da venda em dias de jogos.
É um atentado criminoso contra a cultura do futebol, mais ainda se considerarmos os inúmeros problemas para aquisição dos bilhetes com antecedência. E fica por isso mesmo. Eles fazem a besteira, o pior acontece e aí a punição é aplicada logo ao torcedor, já tão cansado de ser a vítima nesse processo todo.
Agora, depois de reler tudo o que escrevi, percebo que posso ter sido prolixo ou até chato no raciocínio todo. Mas lê quem quer, se identifica quem é torcedor de verdade e eu devo ter razão em tudo isso quando me lembro que logo mais à noite o Palmeiras encara o Grêmio Barueri de Presidente Prudente lá nos malditos confins do Mato Grosso do Sul. À merda todos eles: Barueri, Prudente, políticos, Del Nero, filhos da puta todos.
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