sexta-feira, 18 de junho de 2010

Adeus, Saramago

Por Brizola Neto, via  Tijolaço

Certamente há milhares de pessoas com muito mais condições do que eu de falar de José Saramago, que nos deixou hoje. Mas penso que, assim como eu, muita gente devia se sentir próxima do grande escritor português por sua maneira de pensar e sua solidariedade com os oprimidos.

Nenhum obituário poderá omitir o compromisso de Saramago com os movimentos de libertação; em relação a Cuba, com quem jamais rompeu, apesar das críticas; com a Venezuela, a Palestina, o Haiti, os zapatistas e qualquer povo que sofresse sob ou se libertasse dos desmandos do capitalismo.

São essas características que tornam uma pessoa de esquerda, embora tenham se esforçado tanto para eliminar as diferenças ideológicas que nos separam de quem não pensa no ser humano em primeiro lugar.

Saramago era de esquerda e um tremendo crítico da esquerda, justamente por esperar sempre o melhor dela. No blog que escreveu em seus últimos anos, comentou certa feita a declaração que deu de que “a esquerda não tem nem uma puta ideia do mundo em que vive”. O escritor clamava uma reação à hegemonia capitalista e os males que vinha impondo aos povos do mundo. Mas não ouviu uma resposta sequer à sua provocação.

“O tempo foi passando, passando, a situação do mundo complicando-se cada vez mais, e a esquerda, impávida, continuava a desempenhar os papéis que, no poder ou na oposição, lhes haviam sido distribuídos. Eu, que entretanto tinha feito outra descoberta, a de que Marx nunca havia tido tanta razão como hoje, imaginei, quando há um ano rebentou a burla cancerosa das hipotecas nos Estados Unidos, que a esquerda, onde quer que estivesse, se ainda era viva, iria abrir enfim a boca para dizer o que pensava do caso. Já tenho a explicação: a esquerda não pensa, não age, não arrisca um passo. Passou-se o que se passou depois, até hoje, e a esquerda, covardemente, continua a não pensar, a não agir, a não arriscar um passo. Por isso não se estranhe a insolente pergunta do título: “Onde está a esquerda?”  Não dou alvíssaras, já paguei demasiado caras as minhas ilusões.

Às vezes também nos sentimos assim com a falta de reação a determinadas situações na nossa vida política. Mas assim como Saramago fez até o fim de sua vida, não desanimamos. Encerro este post com uma frase de Saramago que nos ajuda muito nessas horas: “Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo.”

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